Fusão entre Bayer e Monsanto deve agravar insegurança alimentar no mundo – 05.05.2017

Fusão entre Bayer e Monsanto deve agravar insegurança alimentar no mundo – 05.05.2017

Para Victor Pelaez, da UFPR, união de gigantes dos agrotóxicos e dos transgênicos vai ampliar negócios e lucros em países sem restrições a essas tecnologias, apesar dos riscos humanos e ambientais.

Caso as mais de 30 agências regulatórias de todo o mundo aprovem a operação de fusão entre as gigantes da indústria química Bayer e Monsanto, anunciada nesta semana, a nova companhia será a maior do ramo de insumos agrícolas do mundo. Para o Brasil, que se consolidou como maior consumidor de agrotóxicos do mundo e tem um frágil marco regulatório, a transação bilionária representa aumento do risco de insegurança alimentar principalmente quando avançam no Congresso projetos que afrouxam a legislação em vigor. O alerta é do professor Victor Pelaez, do programa de Mestrado e Doutorado em Políticas Públicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

“No país, a produção e o consumo de agrotóxicos seguem ditames capitalistas da chamada Revolução Verde, dos anos 1960, segundo os quais somente com a utilização intensiva desses insumos é possível alimentar a população mundial, quando sabemos que é por meio da distribuição de renda. Além disso, o país prioriza o incremento da produção por meio do agronegócio, que utiliza largamente agroquímicos e sementes transgênicas, relegando a preservação da saúde humana e do meio ambiente como entraves para o desenvolvimento”, disse. “Nos países desenvolvidos, saúde e meio ambiente estão integrados no padrão de consumo.”

O portfólio de produtos da Bayer para a agricultura inclui 26 inseticidas, dois herbicidas e um fungicida. A norte-americana Monsanto produz sementes convencionais – sendo dois cultivares de soja, três de milho e um de algodão – e as transgênicas. Nessa categoria estão um cultivar de soja, seis de milho e quatro de algodão. A empresa ainda fabrica o herbicida Roundup, à base de glifosato, o mais vendido em todo o mundo.

Para a Bayer, a fusão significa mais acesso a sementes, inclusive transgênicas, de soja e trigo. Para a Monsanto, é completar sua linha de produtos com mais de 80 agroquímicos hoje produzidos pela alemã.

Não é a toa que esses conglomerados, além da Basf, Dow e Du Pont, maiores fabricantes de agroquímicos do mundo, vêm adquirindo empresas de sementes nos últimos anos. Além de reduzir o custo de produção de itens diferentes quando se trata de uma mesma companhia – a chamada economia de escopo –, a empresa ganha também ao vendê-los para o mesmo cliente por meio de supostas facilidades.

É o que acontece quando o produtor rural compra sementes e agroquímicos do mesmo fabricante acreditando estar economizando. Em geral, porém, o desconto no preço da semente está embutido no preço do agrotóxico.

“Perfeita” como arroz e feijão, essa combinação vai reconfigurar o mercado mundial de sementes e agrotóxicos, concentrando o mercado, definindo preços, aumentando lucros e dividendos para os acionistas. E para isso, deverá redefinir estratégias de venda voltadas às especificidades dos países. No Brasil, por exemplo, há avanço de projetos de lei que afrouxam a legislação vigente, permitindo maior utilização de agroquímicos.

Desde 2009, a agricultura nacional – sobretudo com o agronegócio – transformou o país no maior consumidor mundial, que consome em média um milhão de toneladas de agrotóxicos por ano. Algo em torno de 5,2 quilos de veneno por habitante, muito mais do que os 1,8 quilos por habitante consumidos em 2012 nos Estados Unidos. O aumento do consumo no país, que na última década foi de 190%, deve-se principalmente à utilização crescente das sementes transgênicas, que produzem plantas capazes de sobreviver mesmo com banhos de veneno cada vez maiores e mais tóxicos.

Quanto maior o consumo dessas tecnologias, menor a segurança alimentar. De acordo com o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), o uso de agrotóxicos é uma das mais graves e persistentes violações do direito humano à alimentação adequada no Brasil porque impede o acesso da população a alimentos livres de veneno e saudáveis.

Para o Consea, ao consumir alimento contaminado, a população não tem acesso a alimentos saudáveis e seguros, ficando exposta aos riscos de desenvolvimento de várias doenças, como diversos tipos de câncer, distúrbios endocrinológicos, neurológicos e mentais, além de mais chances de malformação congênita, distúrbios endócrinos, neurológicos e mentais.

Sem contar que as autoridades de saúde do país consideram “limites seguros”, que ignoram os efeitos da combinação de vários agrotóxicos ingeridos em uma mesma refeição ou ao longo do mesmo dia.

Ameaçadores

Victor Pelaez lembra que, na União Europeia (UE), vigora desde 2011 um marco regulatório do setor com regras mais rígidas. A aprovação dos produtos está baseada na análise do perigo. Formulações associadas ao desenvolvimento de câncer, malformações congênitas ou alterações endócrinas e neurológicas estão proibidas independentemente da dosagem. A lista de substâncias sujeitas a serem banidas inclui 57 ingredientes ativos, empregados em centenas de produtos.

“Isso terá efeitos significativos sobre estratégias de investimentos, que deverão ser voltados para a América do Norte, Ásia e América Latina”, disse.

Segundo ele, até 2014 a Anvisa tinha cerca de 1.500 pedidos de autorização para produtos, 20% deles a base de substâncias passíveis de banimento na UE. Usá-las no Brasil significa riscos de barreiras técnicas comerciais aos produtos exportados para lá.

Como exemplo, o professor lembrou um caso ocorrido em 2011, quando cinco cargas de suco de laranja brasileiro foram barradas nos Estados Unidos por causa da utilização, no cultivo da fruta, de um fungicida em taxas acima do limite permitido.

Enquanto países como o Brasil estiverem comprando esses agrotóxicos, os fabricantes vão vendendo e continuam lucrando com princípios ativos antigos. Os agroquímicos são produzidos principalmente a partir de derivados de petróleo e outras substâncias encontradas na natureza, como cloro, enxofre, nitrogênio, bromo e fósforo. O glifosato é feito com fósforo amarelo, com grandes jazidas na China e nos Estados Unidos – daí empresas chinesas e a Monsanto se beneficiarem.

“Porém, eles sabem que vai chegar a hora em que vão ter de tirar esses produtos do mercado. Por isso já pesquisam a transição da tecnologia química para a biológica, os biopesticidas, em que estão identificando micro-organismos capazes de combater doenças”, diz Victor.

Segundo ele, os estudos começaram há mais de dez anos e já foram desenvolvidos pesticidas microbiais, que consistem em microrganismos; pesticidas bioquímicos, a partir de substâncias encontradas na natureza, que agem por meio de mecanismos não tóxicos, e pesticidas produzidos pelas próprias plantas a partir de genes nelas implantados.

Muitas dessas pesquisas são realizadas por meio de acordo entre Monsanto, Syngenta, Dow e Du Pont com empresas da área de biotecnologia, como Preceres, Novozymes, Marina Biotech, Alnylam, Plant Response Biotech, Radiant Genomics e Caribou.

Os biopesticidas teriam como vantagens menor toxicidade que os agroquímicos e uma suposta maior seletividade no combate aos alvos biológicos indesejados. Além disso, teriam maior eficácia em concentrações menores, decomposição em menos tempo e efeitos adversos ao meio ambiente mais brandos.

Visão pessoal…

A questão central das consequências advindas da compra da Monsanto pela Bayer reside na iminente preocupação acerca do monopólio a se concentrar no ramo da agricultura e da engenharia química na produção dos Organismos Geneticamente Modificados (OMGs), situação protegida constitucionalmente. A Bayer é uma empresa especializada no ramo das ciências nas áreas da saúde e agricultura. De acordo com sua base de “marketing”, a companhia tem como objetivo a distribuição de produtos inovadores e soluções para “melhorar a saúde da população, animais e plantas”. Por sua vez, a Monsanto se intitula como sendo “uma companhia de agricultura sustentável” e que tem como objetivo “a produção de melhores alimentos para os consumidores e uma melhor alimentação para os animais”. Fundada em 1901, ao longo do tempo a empresa alcançou destaque na área da agricultura e da biotecnologia, tendo, hoje, o controle de 90% do mercado de transgênicos no mundo. Para se entender as consequências da fusão entre as duas empresas, é preciso tecer algumas observações sobre a atuação de ambas. No Brasil, a Monsanto possui 36 unidades distribuídas por 12 estados brasileiros. São 19 unidades de pesquisa, oito unidades de processamento de sementes, duas de produção de herbicidas, três de vendas, uma unidade de distribuição e três escritórios administrativos. Seu núcleo de pesquisas foi o responsável pelo primeiro produto geneticamente modificado que se comercializou no mundo. O hormônio recombinante do crescimento, rBGH (Bovine Somatropine), BST, (no Brasil conhecido como Polisac), foi idealizado para que as vacas produzam leite em quantidades superiores à sua produtividade natural. Esse consumo é proibido em alguns países, a exemplo do Canadá, devido a sua utilização acarretar problemas nos organismos das vacas, como cistos nos ovários, desordens uterinas, redução do tempo de gestação, incremento da taxa de gêmeos, retenção da placenta, etc. Além destes, alguns dos produtos produzidos pela Monsanto, como a sacarina, cafeína, vanilina, sedativos, laxantes, adubos, detergente, fibras sintéticas, PCB’s, Agente Laranja, aspirina, poliuretanos, sementes transgênicas e herbicidas vivenciaram diversas polêmicas no que diz respeito a efetividade das suas produções. A Monsanto fora alvo de diversas investigações, sendo indicada como a empresa mais poluente e prejudicial ao meio ambiente e à saúde humana, o que nos remete desde logo a um olhar crítico no que tange a sua expansão cada vez mais acelerada pelo mundo. Mesmo antes da fusão entre a empresa e a Bayer, o monopólio da Monsanto colocou em risco a existência de pequenos agricultores, que dependem dessa para tocar seus negócios. A empresa se utilizou de todas as armas para acabar com as sementes camponesas: ações legais contra agricultores que tentam conservá-las, patentes de monopólio, desenvolvimento de tecnologia de esterilização genética de sementes, etc. Controlou assim, a essência dos alimentos, aumentando sua cota de mercado e capitalizando um exacerbado lucro em decorrência das suas atividades. Nessa senda, a companhia fora a principal concorrente da Bayer. Em que pese a mesma ser uma empresa multinacional e uma das maiores líderes do mercado, com foco em sementes transgênicas e pesticidas, representando, mundialmente, mais de 70% de market share para algumas culturas como milho e soja, a Monsanto por sua vez, espera substituir a tecnologia Roundup Ready (RR), presente em quase 90% das lavouras de soja do país, tendo vencido a patente para tal objetivo em 2010. Notoriamente, tal fusão apresenta-se como um verdadeiro monopólio da atividade, com uma perspectiva econômica ainda mais absurda do que as empresas efetivamente já possuem. Alia-se ao cenário o fato de o Brasil ser o segundo maior produtor de transgênicos no planeta, perdendo apenas para os EUA, e temos uma situação ainda mais preocupante para a população, uma vez que seus “resultados” podem fazer os empresários da Bayer voltarem suas concentrações ainda mais no país. Considera-se, ainda, a péssima experiência suscitada pelas atividades da Monsanto nos Estados Unidos – constatada como a principal poluidora das águas do país -, além de ser causadora de absurda taxa de mortalidade na região da sua sede devido a contaminação da população pelas substâncias químicas – diversos funcionários faleceram após a constatação de problemas neurológicos, imunológicos e psicológicos decorrentes das suas atividades. Por tudo isso, é de extrema importância que todas as atenções de fiscalização voltem-se para esse fator nesse momento. É imprescindível pontuar que o consumo de produtos transgênicos pela sociedade brasileira tem crescido absurdamente; estamos hoje condenados a comer produtos geneticamente modificados de diferentes formas; o uso de sementes transgênicas na agricultura pretende funcionar no Brasil como “alternativa fundamental” para se alcançar consideráveis aumentos de produtividade, contudo, jamais fora observado a efetividade de tais promessas. A Monsanto sempre obteve grande influência na economia e na política brasileira, com alguns de seus representantes, advogados e sócios figurando como membros de grandes setores governamentais, além de possuir vasta força no âmbito acadêmico. Tamanho poder pode sim representar também uma grande ameaça à saúde, alimentação e à preservação do meio ambiente, sem intervenções estatais e com uma desprezível impunidade. É basilar que a legislação endureça a atuação da empresa, fiscalize suas atividades e não se corrompa diante da grande influência econômica decorrente desta fusão, sob pena de se cravar no país um cenário de absurda corrupção, degradação do meio ambiente e violação aos preceitos garantidos constitucionalmente.

Inspiração…

Fusão entre Bayer e Monsanto deve aumentar … – MTHD

Duas Gigantes do Setor Agrícola

Made in Hell: Bayer compra Monsanto – Nasce a Pior Empresa do Mundo

A História da Indústria de Agrotóxicos no Brasil

(Nota Gilberto – Assista também: “O Mundo segundo a Monsanto“)

Recomendo…

Fonte – Monicavox

Deixe um comentário

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Imagem do Twitter

Você está comentando utilizando sua conta Twitter. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s